Uma das minhas primeiras actividades enquanto Post-doct Fellow na UQAM | Université du Québec à Montréal: a participação numa conferência (no dia 30 de Setembro) de um dos mais importantes sociólogos europeus do século XX, o veterano ALAIN TOURAINE (o senhor de cabelos brancos, de 89 anos, que está sentado na mesa). Contudo, a diplomacia académica em que estou imbuído obriga-me a lamentar a profunda cegueira que ainda grassa no seio das Ciências em geral e nas Ciências Sociais e Humanas em particular - que se sente de forma vincada nas Universidades do Norte Global - em relação a outras constelações cosmogónicas que existem pelo mundo. Infelizmente, a secreta esperança que eu tinha de que a longevidade do Touraine o pudesse ter tirado das malhas do eurocentrismo - até porque para produzir conhecimento «novo» a idade e o tempo não são adversários imbatíveis - saiu frustrada pois o máximo que vislumbrei nas suas palavras foi uma crítica interna à ciência moderna e não ao quadro eurocêntrico que o enforma ignorando, consequentemente, o papel fundamental do colonialismo europeu para a sua hegemonia. É razão para, resgatando e ecologizando a máxima utilizada pelos movimentos de libertação em África dos anos 60 e 70 do século XX, afirmar que «a luta continua!»
http://www.evenements.uqam.ca/?com=detail&eID=501158
Tuesday, October 07, 2014
Wednesday, June 18, 2014
O Mourinho Racista
Admito que sou um dos que considerava o José Mourinho um treinador de futebol acima da média devido, essencialmente, ao facto de ele apostar no conhecimento emocional dos seus jogadores de modo a tirar, friamente, proveito disso em termos desportivos. Mas afinal, o homem que eu tinha como sendo um «ignorante douto» padece - assim revela o seu comentário em relação ao que fez Pepe no presente mundial de futebol - de uma séria enfermidade intelectual chamada «ignorância ignorante». Não só devido ao teor paternalista (parece que foi Portugal que prestou um grandíssimo favor ao ex-colonizado Pepe ao lhe atribuir uma segunda nacionalidade e não o contrário), xenófobo e racista das suas palavras, demonstrativo da visão limitada que ainda grassa por este mundo sobre a identidade (que é, por natureza, complexa, contextual, compósita, plural, conflituosa, «assassina» e alucinante...), mas por revelar um desconhecimento abismal sobre si mesmo. Pois é, o senhor Mouro Pequeno (Mourinho para respeitar a grafia oficial), parece olvidar, a julgar pelo seu apelido, que também ele não é Português, no sentido em que as suas raízes - tal como de todos os outros seus concidadãos - podem não estar somente na península ibérica, mas, por exemplo, na Mauritânia (a terra dos Mouros e dos Negros que ocuparam a dita península durante a dinastia dos Almorávidas) no Norte de África. Pois é senhor Mouro Pequeno (não resisti a repetir isso), não se olhar ao espelho dá nisso e basta começar-se a escavar e a desconstruir as narrativas identitárias essencialistas para acabarmos por chegar, mais cedo ou mais tarde, ao primeiro humanoide que, segundo rezam as crónicas, surgiu no que convencionalmente passou a chamar-se de África a partir do encontrão violentão colonial.
Contudo, para que conste, considero que Pepe é um jogador execrável que nunca mais devia jogar pela selecção portuguesa e por equipa alguma por representar algo que o futebol e todas as actividades humanas precisam continuamente combater: a violência.
Thursday, January 30, 2014
O Ghandi Racista
Sessenta
anos após a morte de Mohandas Karamchand Gandhi (02-10-1861/30-1-1948), vale a
pena aproveitar esta oportunidade para realçar a necessidade de “desconstruir”
os mitos (os heróis são de carne e osso e estão pejados de paradoxos e
ambiguidades) criados ao sabor dos interesses de determinados grupos e/ou
actores: sem pôr em causa a defesa de que Ghandi é um dos pais do princípio da
não-violência e do Pacifismo [embora eu defenda que existe uma confusão/distorção
conceptual na equiparação entre a desobediência civil defendida e praticada por
Ghandi – poucos sabem, ou ignoram propositadamente, que Ghandi, a seguir à
independência, criou milícias armadas para “proteger” o novel Estado – e a
corrente extremista do Pacifismo pois a primeira implica não só a utilização da
violência necessária para resistir à
opressão como também uma organização proactiva e rebelde visando atingir à emancipação
ao contrário do Pacifismo radical que defende uma postura passiva dos
pacifistas, ou seja, a não utilização da violência em nenhuma situação], é
preciso reconhecer, sem dramas, que o racismo – enquanto herança cultural do colonialismo
britânico na Ásia e em África, mais particularmente na África do Sul onde
Gandhi trabalhou - está bem presente no pensamento dele. Os exemplos são
diversos: a 7 de Março de 1908, Gandhi opinou no jornal Opinião Indiana acerca do tempo que passou numa prisão sul-africana
da seguinte maneira: “Os cafres [negros.
É de realçar, contudo, que a palavra kaffir
tinha uma conotação diferente, mais neutral, no tempo de Gandhi em relação
ao seu significado actual onde é considerado ofensivo] são, em regra incivilizados – os condenados são-no ainda mais. Eles são
problemáticos, muito sujos e vivem quase como animais” (Ghandi, 1960-1994: 199).
Sobre o tema da imigração, em 1903, Gandhi diz: “Acreditamos na pureza da raça tal como nós
pensamos que eles acreditam...acreditamos também que a raça branca na África do
Sul deve ser a raça predominante” (idem: 255). Gandhi protestou
repetidamente contra a equiparação da classificação social dos negros com a dos
indianos na África do Sul e descreveu os indianos como “sem dúvida, infinitamente superior aos cafres” (idem: 270).
E não abro
mais o véu indiano para não transformar pacifistas gandhianos em belicistas com
um único alvo…
Fontes:
-The Collected Works of Mahatma
Gandhi, Vol. 3 e 8. Publications Division, Ministry of
Information & Broadcasting, Government of India. New Delhi: India. 1960/1994/1998.
-Carroll, Rory (2003), “Gandhi
branded racist as Johannesburg honours freedom fighter”. Disponível em: http://www.theguardian.com/world/2003/oct/17/southafrica.india (acesso a
30 de Janeiro de 2014).
Subscribe to:
Posts (Atom)